segunda-feira, 3 de outubro de 2011

"Seminário Marca Adesão do Brasil ao Desenvolvimento das Células Combustível" (dezembro de 1999)


Ilustração por José Adnael Silva.
Realizado no dia 09 de dezembro pela FIESP / CIESP, o seminário "Células a Combustível – a energia do futuro", além de despertar a atenção da sociedade brasileira para o assunto, mostrando a importância, vantagens do seu uso, e o panorama atual do desenvolvimento e aplicações das células a combustível no Brasil e no mundo, serviu também como palco para anúncio de vários acordos e programas que colocam o país na vanguarda do desenvolvimento desta tecnologia.
O Evento foi realizado no Salão Nobre da FIESP/CIESP em São Paulo, tendo como patrocinadores a Mercedes-Benz, PETROBRAS e a DU PONT, contando ainda com o apoio do Ministério da Ciência e Tecnologia, e da SAE Brasil, tendo reunido várias autoridades, pesquisadores e técnicos.

ACORDOS E PROGRAMAS ANUNCIADOS
Logo na solenidade de abertura o Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia - Ronaldo Mota Sandenberg anunciou para o mesmo dia a celebração de acordo de cooperação técnica entre o MCT, o Governo de São Paulo, a UNICAMP, a USP, a CEMIG e o Instituto Vitae Civilis para a criação do Centro Nacional de Referência em Hidrogênio - De grande importância para o desenvolvimento das células combustíveis, já que o hidrogênio é apontado como o combustível ideal para as mesmas, e o que atualmente tem apresentado melhores resultados, sendo utilizado na maioria das pesquisas de desenvolvimento de células combustível para transporte.
O Ministro mencionou ainda projetos a serem concretizados a partir deste ano entre eles
O projeto de desenvolvimento de protótipo de célula combustível de polímero condutor iônico para funcionamento com etanol, envolvendo parceria entre o MCT, a USP de São Carlos, a Empresa CLAMPER e a CEMIG, colocando o país como pioneiro no desenvolvimento de célula a combustível para este tipo de álcool.
Foi anunciado ainda o projeto de produção de hidrogênio a partir do etanol, para aplicações automotivas , com a colaboração da Daymler-Chrysler, Ford, Shell, IPT, TECPAR, CEEPAL, CTC, Única e UNICAMP. Esses dois projetos são de fundamental importância para o país já que compatibilizam a tecnologia das células a combustível com a matriz produtiva e rede de distribuição de etanol já existente, assegurando meios a ampliação vantajosa da exploração do grande potencial energético de biomassa que dispõe.


Durante o seminário o Diretor de Desenvolvimento da Mercedes-Benz – Sr. Horst Bergmann anunciou metas para a produção em São Paulo do chassis OH-1725 L-LE para ônibus elétrico alimentado por células a combustível, tendo como fonte energética o hidrogênio pressurizado em cilindros, com implantação prevista para o primeiro trimestre de 2000, devendo serem produzidos até dezembro de 2003, oito chassis, que servirão a montagem dos ônibus completos, através das empresas encarroçadoras: Marcopolo e Busscar. Este projeto tem a parceria da EMTU - São Paulo, e a obtenção do hidrogênio será feita a partir de eletrólise, utilizando a eletricidade da rede de distribuição nos horários de baixa demanda.
Quanto a eletrólise, conforme exposição do Dr. Luis Alberto Avaca – Professor associado do Instituto de Química de São Carlos -, o Brasil já domina inteiramente a tecnologia dos eletrolisadores, tendo sido desenvolvida pela USP de São Carlos, nos anos de 1977 até 1987, e transferida para à CESP, que posteriormente repassou à Vilares, vindo esta a produzir eletrolisadores comercialmente. Tal domínio amplia e facilita o envolvimento de outros setores nacionais no projeto.

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PESQUISAS PARA OBTENÇÃO E ADEQUAÇÃO DE COMBUSTÍVEIS

Durante as exposições também ficou claro que o futuro das células combustíveis além do desenvolvimento das células em si, depende também da tecnologias de obtenção e adequação dos combustíveis e, em alguns casos, da tecnologia do armazenamento destes.

O HIDROGÊNIO
Um caso especial é o hidrogênio, que apesar de não ser uma fonte energética (não é encontrado livre no nosso planeta, nem existem fontes naturais de produção do mesmo) é considerado por muitos um combustível ideal, entre outras razões pelas características de:

  • Alto poder energético
  • Não-poluente - sua combustão resulta apenas vapor d´agua
  • Múltiplas formas de obtenção com alta eficiência: por eletrólise da água; por reforma de alcool e hidrocarbonetos ( metanol, etanol, metano, gás natural e outros ) etc.
 A obtenção do hidrogênio, além de tema de palestra no seminário, foi abordado pela maioria dos palestrantes., ficando demonstrado que o Brasil já domina largamente a tecnologia da hidrólise e está engajado no desenvolvimento de reformadores catálicos para sua obtenção, destacando-se o citado projeto do MCT em parceria com a UNICAMP e empresas de vários setores para a produção de hidrogênio a partir do etanol.
O uso hidrogênio apesar das vantagens oferecidas, tem ainda como "calcanhar de aquiles" o seu armazenamento, e a nível mundial existem várias pesquisas para obtenção de meios realmente seguros e eficientes, sendo atualmente as principais formas de armazenamento desenvolvidas, com algumas considerações, descritas a seguir:
  • Liquefação por Criogenia (resfriamento a baixas temperaturas): Apresenta alto custo e necessita de alta tecnologia para sua obtenção, o volume necessário para armazenamento torna-o bastante atrativo para uso em veículos de passeio.
  • Pressurização do gás (armazenamento em cilindros): Exige grandes volumes para uma autonomia razoável, já é bastante compatível e viável em transporte de massa como ônibus ou aplicações estacionárias
  • Hidretos de metais (ligas metálicas com poder de absorção do hidrogênio e liberação controlada por aquecimento moderado): apesar de altamente seguro, ainda tem como maiores desvantagens o volume e peso necessários.
Durante espaço aberto para debate, o Prof. Paulo Emílio de Miranda – Laboratório de Hidrogênio da COPPE/UFRJ -, que participou como ouvinte, lembrou o trabalho da UFRJ/COPPE que em parceria com a Renault, pesquisa o armazenamento de hidrogênio numa linha não convencional, onde, diversamente ao uso de ligas formadoras de hidretos, são utilizadas ligas metálicas amorfas, e o hidrogênio é armazenado por solução sólida sob a forma protônica.

OUTROS COMBUSTÍVEIS
Em relação ao desenvolvimento de células para funcionamento direto com outros combustíveis, destaca-se o projeto de desenvolvimento de protótipo de célula combustível de polímero condutor iônico para funcionamento com etanol, envolvendo parceria entre o MCT, a USP de São Carlos, a Empresa CLAMPER e a CEMIG.
Estudos também estão sendo feitos pela TECPAR para se avaliar a qualidade do álcool carburente comercial, assim como analisar a questão da contaminação devido a transporte comum, e determinação das características do álcool para as células a combustível.
Conforme exposição sobre o desenvolvimento das células a combustível pela Dra. Maria Isabel Caires - Pesquisadora do IQSC -, pesquisas para tal já vêm sendo realizadas no Brasil, principalmente pela USP que mantém, desde 1981, no Instituto de Química de São Carlos, uma equipe de pesquisadores (da qual faz parte), tendo inclusive alguns trabalhos alcançado reconhecimento internacional. ( Veja na seção Radar link´s para página sobre o trabalho do IQSC, e para o artigo sobre células a combustível da Dra. Maria Isabel).

PANORAMA MUNDIAL
As células combustíveis apesar de ter seus princípios descobertos em 1839, permaneceu sem uso prático por muito tempo até que a corrida espacial nos anos 50/60 trouxe grande motivação para seu desenvolvimento, tendo sido utilizada em naves espaciais tripuladas para produção de eletricidade e fornecimento de água.
Apesar das vantagens das células combustíveis, seu alto custo e uma relação peso/potência bastante desfavorável em relação a outros sistemas não se fazia prever sua aplicação em larga escala, sendo citada por muito tempo, apenas como uma remota probabilidade para um futuro distante.
Mas os efeitos agravantes dos problemas ambientais causados pelos combustíveis fósseis e a conscientização das nações para as estas questões, refletiu-se em leis cada vez mais severas impondo limites de poluição aos novos veículos, este fato colocou a indústria automobilística na busca de novas alternativas para os motores a combustão, sendo umas das principais linhas de pesquisas adotadas o desenvolvimento da célula combustível.
O poder de investimento desta indústria trouxe progressos impressionantes, uma demonstração desta evolução pode ser vista no seminário, na exposição do Sr. Horst Bergmann, onde foi mostrado os resultados alcançados pela Daymler-Benz - Atual Daymler-Chrysler - no desenvolvimento de seus protótipos.
O primeiro protótipo da empresa, produzido em 1994, o NECAR I, era um veículo utilitário de porte médio similar ao MB-180, este tinha quase todo o espaço destinado originalmente a carga e passageiros ocupado pelo sistema de propulsão e armazenamento, a potência era de apenas 50 KW e o combustível utilizado era o hidrogênio comprimido permitindo uma autonomia de aproximadamente 130 Km.
Atualmente os protótipos desenvolvidos são NECAR IV e V, baseados no compacto de linha da empresa, o Classe A. O sistema atual é tão compacto, que o veículo, apesar de suas dimensões reduzidas, tem capacidade de carga e passageiros (cinco) similar ao de propulsão convencional, além disto o veículo tem um desempenho muito perfomante desenvolvendo até 70 KW, a densidade energética das batérias evoluiu significativamente, reduzindo a relação de 21Kg/KW no NECAR I, para 5Kg/KW dos veículos atuais. Os combustíveis utilizados são: o hidrogênio líquido no NECAR IV, e hidrogênio retirado do metanol, através de reformador catálico on-board, no NECAR V. Ambos permitem autonomia superior a 400 Km, e a empresa prevê a entrada na linha de produção de veículos similares em 2004.
Além destes veículos de passeio a empresa mantém também o NEBUS, ônibus de passageiros, que desenvolve 250 KW e utiliza hidrogênio comprimido armazenado em cilindros. Veículo similar deve ser desenvolvido no Brasil através da Mercedes-Benz.
Além das vantagens ambientais, estes tipos de veículos possuem dirigilibidade superior aos de propulsão de ciclo otto ou diesel, podendo se desfrutar de todas as vantagens inerentes aos veículos de propulsão elétrica, como: funcionamento isento de barulhos ou vibração; alto torque na partida; aceleração proporcional e vigorosa; e ausência de câmbio.
Atualmente praticamente todas as grandes montadoras automobilisticas mantêm programas de desenvolvimento de protótipos baseados em células combustíveis.

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PRESPECTIVAS JUNTO AS ENERGIAS RENOVÁVEIS



Como mencionado pelo Dr. José Roberto Moreira, Presidente do Conselho Diretor do Centro Nacional de Referência em Biomassa - CENBIO, durante o seminário, o desenvolvimento das células a combustível deverá beneficiar também a utilização de energias renováveis, pois uma das principais barreiras para o uso de alguns tipos, principalmente a eólica e a solar, refere-se ao armazenamento, fator que tem limitado o uso destas ou a sistemas híbridos - onde entram como parcela minoritária na co-geração - ou a pequenos sistemas de eletrificação rural, bombeamento d`agua, telecomunicações etc – onde o uso de baterias como meio de armazenamento é aceitável ou mesmo dispensável.

O desenvolvimento dos hidrolisadores, células combustíveis e formas de armazenamento do hidrogênio poderá viabilizar sistemas autônomos de energia solar, eólico e ou solar-eólico, onde o armazenamento de energia seria feito através do hidrogênio combustível, permitindo implementação de sistemas de armazenamento para grandes quantidades de energia e longos períodos sem perda ou degradação energética, formando um sistema autônomo de alta eficiência, limpo e confiável.

CÉLULAS A BIOGÁS - UMA REALIDADE
Isento dos problemas de armazenamento, o biogás também pode ser beneficiado com o maior aproveitamento energético das células a combustível, já existindo células a combustível para funcionamento direto com gás metano.
A revista Brasil Energia, N.º 229 Dezembro de 1999 - pg.89. em sua matéria "Alemanha inova na geração térmica" mostra a implantação em Colônia, com funcionamento previsto para janeiro de 2000, de uma usina para geração de energia elétrica a partir do metano descartado em uma planta de tratamento de esgoto (onde na maioria dos casos é queimado e descarregado, ou apenas liberado, na atmosfera) com a conversão feita por células a combustível. A mesma matéria informa estarem em operação três sistemas semelhantes e outros dois instados em aterros de lixo nos Estados Unidos, e mais três em plantas de tratamento de esgotos no Japão, sendo que no mundo todo o número é de aproximadamente 200.


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